Estamos falando de um contexto de guerra híbrida, de guerra racial de alta intensidade, de avanço do neoliberalismo e aprofundamento das desigualdades, somado aos agravos da crise sanitária causada pela ingerência da pandemia de Covid-19 e seus números desastrosos. Vivemos atualmente no Brasil um cenário de insegurança alimentar, alto índice de desemprego e informalidade, alta inflação no preço de itens básicos, crise hídrica e elétrica, agronegócio, além do acirramento da perseguição contra comunidades e povos tradicionais, às custas da implementação de um modo de vida que visa explorar de forma predatória os recursos naturais e nos manter como escravos.
Do nosso lado da história, nós povo preto, descendentes da diáspora afrikana forçada para o Brasil, desde o princípio resistimos e criamos estratégias de sobrevivência e permanência do nosso modo de vida nesse território, não aceitamos passivamente a condição de dominados apesar de reconhecer que nessa guerra, estamos na posição de vítima. Entre tantas formas de insurreições, os quilombos são a nossa maior expressão de auto organização comunitária de uso coletivo da terra, como um projeto comum de manutenção da vida com condução própria, dentro de valores próprios, como elaborou a quilombola e intelectual Beatriz Nascimento, o quilombo é uma ‘‘possibilidade nos dias da destruição’’;
É essa experiência histórica que nos trouxe até aqui e que nos propomos a ser continuidade, e é movido por esse espírito de construção coletiva de um modo de vida que realmente contemple a nossa existência que convocamos toda a nossa comunidade para mais uma vez nos aquilombarmos em torno do XX Caruru de Ibeji e as Pedagogingas para discutirmos o tema ‘‘Terra, água e comunicação - Quilombo D’Oiti: uma possibilidade nos dias da destruição’’, de 13 a 17 de outubro de 2021 em formato híbrido (online e presencial).
Nosso povo se encontra encurralado nas periferias urbanas, sem terra para viver e produzir seu sustento, sob forte repressão policial e socialmente segregados, sem acesso a educação, saúde, lazer, vistos como inimigos internos e tratados como massa de manobra política. A convocação é para construção de um projeto político autônomo de sobrevivência centrado na ocupação e uso coletivo da terra para o desenvolvimento comunitário preto.
Em Itacaré/BA, às margens do Rio de Contas, no território ancestral que remonta o Quilombo do Oitizeiro, o 3º maior quilombo da história do Brasil, está localizada a Fazenda Modelo Quilombo D’Oiti de onde parte o projeto comunitário, preto e autônomo de afro desenvolvimento conduzido pela Casa do Boneco de Itacaré na última década, fruto do processo de luta racial construído pela organização há mais de 30 anos. A Fazenda Quilombo D’Oiti vem se constituindo como espaço permanente de vivências e formações voltadas para a manutenção de saberes tradicionais afrodescendentes, sustentabilidade, formação política, empreendedorismo e geração de renda através do impulsionamento de um programa de Turismo Étnico de Base Comunitária referenciado nacionalmente e que tem impactado na formação de gerações de jovens.
Com esse acúmulo histórico e prático somado à experiência de outros núcleos articulados na caminhada, temos alternativas concretas de uso coletivo da terra, soberania alimentar, soberania energética, educação, saúde, onde o Quilombo é a sintetização territorial que só é possível de se concretizar a partir de organização dentro de um programa político autêntico, preto, autônomo construído sob o trabalho comunitário. É tempo de aquilombar-se, essa é a convocação. Aqueles que se encontram desgarrados e sem perspectivas, é tempo de juntar-se com propósito de construção e sobrevivência. Ou nos organizamos agora ou nossos dias estão contados.
Espaços de aquilombamento como a Casa do Boneco - Quilombo D’Oiti devem ser compreendidos como legado de luta política afrodiaspórica que serve ao fortalecimento do povo negro e que por ele deve prioritariamente deve ser fortalecido. Não há perspectiva de vida para nós sob domínio da supremacia branka. Em tempos distópicos como o que estamos vivendo, a nossa sobrevivência enquanto povo passa prioritariamente pela garantia dos territórios, da terra, da água e da comunicação, onde através da condução ancestral nos firmamos em defesa da pauta primordial que é nos manter vivos e criar as estruturas para aqueles que virão.
inscrições: https://forms.gle/rCU43vGKENrnJdMB7
Vakinha: http://vaka.me/2359607
Nenhum comentário:
Postar um comentário